Antônio Gois (Folha de S. Paulo, 30/10/11) diz que o anúncio, pela ONU, de que chegaremos simbolicamente hoje ao marco de 7 bilhões de habitantes reacendeu o debate sobre a capacidade do planeta de prover recursos para sustentar, com qualidade, tanta gente. A preocupação é justificada pela constatação de que a maior parte do crescimento projetado para o futuro acontecerá em países pobres. Até 2100, a ONU estima que a população aumentará em mais 3 bilhões. Dez países, sozinhos, serão responsáveis por mais da metade disso. Oito são africanos.
O caso mais extremo é o de Zâmbia, onde a expectativa de vida hoje é de apenas 49 anos, quando a média mundial é de 69. Em intervalo de 90 anos, a população decuplicará. Completam a lista a Índia, que tirará da China em 2020 o posto de maior população, e os Estados Unidos, único entre os mais ricos (exceto BRIC) que continuará, graças à maior fecundidade de imigrantes, entre os dez maiores.
O temor de que as condições de vida piorarão por causa do aumento populacional aflige parte da humanidade ao menos desde que o reverendo Thomas Malthus, em 1798, colocou em dúvida a capacidade do planeta de prover subsistência para todos. Até o momento, as previsões de Malthus e de outros pessimistas que ecoaram suas ideias não se confirmaram. Nos últimos 60 anos, apesar de termos vivido uma verdadeira explosão populacional, de2,5 para 7 bilhões, a expectativa de vida aumentou em mais de 20 anos.
No entanto, no debate atual sobre a capacidade do planeta de prover recursos naturais para sustentar uma população crescente, há uma nova variável ainda sem resposta: oaquecimento global. Se, para alguns, são os países pobres que ameaçam sobrecarregar o planeta por causa de suas altas taxas de fecundidade, para outros, a principal responsabilidade é dos países ricos e seus atuais padrões de consumo.
No Maláui, por exemplo, a taxa de fecundidade supera a média de seis filhos por mulher. Nos Estados Unidos, está próxima de dois. No entanto, um único americano impacta no aquecimento global o equivalente, segundo a ONG Global Footprint Network, a 11 habitantes do Maláui.
Esse impacto humano será ainda maior no planeta se os 3 bilhões a mais de habitantes até 2100 tiverem padrões de consumo semelhantes aos de nações ricas hoje.
Para Harold Robinson, representante do Fundo de População da ONU no Brasil, uma solução que reduza as desigualdades e, ao mesmo tempo, agrida menos o ambiente terá que vir de inovações tecnológicas.
Para quem está curioso para saber qual será o bebê que amanhã fará a humanidade chegar aos 7 bilhões, um conselho: desista. A data de 31 de outubro é muito mais simbólica do que precisa. As estimativas da entidade são feitas a partir de dados dos censos de cada país. Mesmo em países ricos, estima-se que esses levantamentos deixem de contar até 3% da população.
Nas nações pobres, justamente as que mais puxam o crescimento, os censos, além de menos frequentes, tendem a ser ainda menos exatos. Para compensar, a ONU faz estimativas a partir de hipóteses sobre o comportamento da fecundidade e mortalidade, que podem se confirmar ou não no futuro, para mais ou para menos.
O bebê de número 7 bilhões, portanto, pode ter nascido ontem, no ano passado, ou nem foi concebido. Isso, no entanto, não tira a importância das projeções para analisar tendências de longo prazo. Ao estabelecer uma data, o que a ONU quis foi estimular o debate.
José Eustáquio Diniz Alves, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, escreveu o seguinte artigo (Folha de S. Paulo, 30/10/11).
“Quando nasci, em agosto de 1953, fui o habitante de número 2.610.233.456. Quando minha filha veio ao mundo, em março de 1985, ela foi o habitante de número 4.710.843.383.
Em 58 anos, a população mundial aumentou em 4,4 bilhões de habitantes. Durante os 26 anos de vida de minha filha caçula, o aumento foi de 2,3 bilhões. Nos próximos 32 anos, teremos mais 2 bilhões de pessoas, e a população mundial deve chegar a 9 bilhões em 2043.
Existem duas boas noticias acompanhando esses números. A primeira é que a população mundial cresceu, aumentando conjuntamente a esperança de vida, que era de 48 anos no quinquênio 1950-55 e passou para 68 anos no período 2005-2010. A segunda é que o ritmo de crescimento demográfico está em declínio e existe grande probabilidade de a população mundial se estabilizar na segunda metade do século 21.
O número de nascimentos no mundo ficou estabilizado em torno de 136 milhões de crianças entre 1990 e 2010. Porém esse número já começou a cair.
Com a redução da base da pirâmide populacional, a razão de dependência demográfica vai ficar abaixo de 60% entre o ano 2000 e 2050. A mudança na estrutura etária, em geral, traz um bônus demográfico que pode ajudar na redução da pobreza no mundo.
Mas essa janela de oportunidade só será aproveitada se mudar o modelo de produção e consumo que tem provocado o aumento da pegada ecológica da humanidade. O nível atual de exploração do ambiente já ultrapassou em 50% a capacidade de regeneração do planeta. Estima-se em US$ 1,3 trilhão o custo anual da transição para uma economia verde, sustentável e de baixo carbono. É 30% menos que o gasto militar do mundo anualmente.
Vamos dar as boas vindas ao habitante de número 7 bilhões. Mas, principalmente, vamos nos esforçar para deixar uma herança positiva para que esse bebê de hoje não se torne um jovem frustrado”.